sexta-feira, 22 de novembro de 2013

CARTA ABERTA À PRESIDENTA DILMA ROUSSEFF



CARTA ABERTA À PRESIDENTA DILMA ROUSSEFF

SOBRE AMEAÇAS E ATAQUES DE RURALISTAS CONTRA POVOS INDÍGENAS

INTERVENÇÃO FEDERAL NO MATO GROSSO DO SUL JÁ!!!

VIA Conselho Indigenista Missionário – Cimi







À
Presidenta Dilma Rousseff

Desde a morte de Oziel Terena, assassinado por forças policiais durante o cumprimento de uma reintegração de posse na terra indígena Buriti em maio deste ano, uma série de acontecimentos tem colocado em risco a segurança e a vida das comunidades indígenas do Mato Grosso do Sul. Em sua guerra particular contra os povos indígenas, fazendeiros tem se manifestado de forma cada vez mais agressiva no discurso e na ação contra estes povos.

Estimulado por declarações violentas e preconceituosas de fazendeiros e seus representantes no Mato Grosso do Sul, o conflito chega a um estado de recrudescimento que exige de nós, organizações indígenas e indigenistas, vir a público mais uma vez denunciar a situação urgente e gravíssima dos povos originários do estado, e exigir uma intervenção federal imediata no Mato Grosso do Sul, de modo a evitar mais uma tragédia anunciada no Brasil.

Em Campo Grande, durante a invasão da sede da Fundação Nacional do Índio por 150 produtores rurais, no dia 19 de novembro, uma fazendeira gritou, dirigindo-se a indígenas que estavam no local: "o dia 30 está chegando (...), e rogo uma praga a vocês: morram. Morram todos!". Foi aplaudida pelos manifestantes.

Dia 30 de novembro foi o prazo final estabelecido pelos produtores rurais do Mato Grosso do Sul para que o governo solucione os conflitos fundiários no estado. No entanto, prevendo que o Estado não consiga apresentar uma proposta que efetivamente dê cabo do problema - e que favoreça o segmento do agronegócio - os fazendeiros, através de suas associações, tem pública e repetidamente dado declarações como esta.

"O prazo para uma solução final é 30 de novembro. Depois disso, como já é tragédia anunciada, os fazendeiros irão partir para o confronto legítimo para defender seu direito de propriedade. E vai haver derramamento de sangue, infelizmente", declarou o vice-presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul), Jonatan Pereira Barbosa, na tribuna da Comissão de Reforma Agrária do Senado Federal, no dia primeiro de novembro, conforme publicado no sítio eletrônico da entidade.

O presidente da Acrissul, Francisco Maia, no último dia 8, em reunião com 50 produtores rurais do estado, disse: “A Constituição garante que é direito do cidadão defender seu patrimônio, sua vida. Guarda, segurança, custa dinheiro. Para entrarmos numa batalha precisamos de recurso. Imagine se precisamos da força de 300 homens, precisamos de recurso para mobilização”.

Em nova reunião, no dia 12 de novembro, o vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), Nilton Pickler, também veio à público corroborar a posição da Acrissul: “Estamos em uma terra sem lei, onde invadir propriedade não é mais crime, alguma reação precisa ser feita”, afirmou.

As entidades representativas dos produtores rurais do estado estão organizando, para o dia 7 de dezembro, em Campo Grande, um leilão de animais, commodities, máquinas e produtos doados pelos próprios pecuaristas do estado, para arrecadar recursos para ações contra os indígenas. Deram ao evento o nome de "Leilão da Resistência". Declararam, no último dia 19, que já receberam 500 cabeças de gado como doação, equivalentes a, no mínimo, 500 mil reais.

O documento final da Quarta Assembleia do Povo Terena, que contou com a participação de mais de 300 lideranças Indígenas de todo o estado, representando os mais de 70 mil indígenas que lá vivem, declarava: "a tragédia está anunciada em Mato Grosso do Sul (...). É pública e notória a ameaça concreta intentada contra os povos indígenas pelos ruralistas deste estado". Para os indígenas, está claro: os “leilões da resistência" anunciados pelos produtores rurais "tem por objetivo financiar milícias armadas".

Em carta, os indígenas criticaram o Estado pelo abandono das negociações, no sentido de encontrar saídas para a questão indígena. "O governo federal instalou (...) uma mesa de diálogo na tentativa de resolver a demarcação de nossos territórios. No entanto, após vários prazos estipulados pelo próprio ministro [da Justiça], não há nada de concreto a ser apresentado aos povos indígenas".

As comunidades Terena, Guarani-Kaiowá, Guarani Ñandeva, Kinikinau e Kadiwéu em luta pela garantia de seus territórios tradicionais, tem relatado e denunciado à Polícia Federal, à Funai e ao MPF um sem número de casos de ataques a tiros, invasões, intimidações e ameaças de morte que os indígenas vem sofrendo no último período. Apesar disso, até o momento, nenhuma segurança permanente está sendo oferecida a estes povos.

Os indígenas conhecem bem o trabalho da segurança privada que os fazendeiros pretendem ampliar na região. Em contexto do conflito envolvendo indígenas e fazendeiros, em novembro de 2011, a empresa de segurança privada Gaspem, que prestava - e ainda presta - serviços a proprietários de terras que incidem sobre território tradicional indígena, foi acusada de envolvimento na morte do rezador Guarani-Kaiowá Nízio Gomes, no tekoha Guaiviry, em Aral Moreira. Na denúncia, o Ministério Público Federal do Mato Grosso do Sul (MPF-MS) classificou as atividades da empresa como de uma “milícia privada”, exigindo a suspensão das atividades da companhia. Em função do caso, sete pessoas estão presas, conforme relatou o MPF.

Jornais e televisões locais também tem associado o termo "milícias armadas" ao discurso dos ruralistas sobre o leilão e sobre as ameaças do dia 30 de novembro. Agências de notícias internacionais categorizaram o caso como "conflito sangrento (...) com características de guerra territorial".

É público e notória que, no Mato Grosso do Sul, os fazendeiros estão organizando força paramilitar para atentar contra a vida de coletividades e contra o Estado de direito no Brasil.

A "resistência" dos latifundiários é contra a demarcação das terras indígenas. É contra a realização de laudos e perícias pela Funai. É contra a organização política dos indígenas, que avançam na retomada de seus territórios tradicionais, frente à morosidade do Estado e da Justiça, de toda a violência que vem sofrendo, das mãos das forças policiais estaduais e federais, e das seguranças privadas “legais” ou ilegais que atuam na região. A dita "resistência" é, a rigor, contra a vida destas pessoas.

Em função desta conjuntura, extensão de um violento processo histórico de espoliação, confinamento e extermínio dos povos indígenas desta região, as organizações signatárias vem a público exigir da presidente Dilma uma intervenção federal imediata no Estado do Mato Grosso do Sul. O poder público pode e deve evitar esta “tragédia anunciada”, repetição sistemática do genocídio contra os povos indígenas. E isto precisa ser feito agora. O reconhecimento e a demarcação das terras indígenas é a verdadeira solução para a situação que está posta no Mato Grosso do Sul.

Brasília, 21 de novembro de 2013.

Conselho Indigenista Missionário – Cimi
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul – ArpinSul
Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – Apoinme
Aty - Guassu Guarani Kaiowá
Conselho de Caciques Terena
Conselho Indígena de Roraima - CIR
Instituto Kabu - Nejamrô Kayapó
Associação dos Índios Tupinambá da Serra do Padeiro - AITSP
CCPIO AP. Galibi Marworno - Paulo R. Silva
Vídeo nas Aldeias – Vicent Carelli
Operação Amazônia Nativa – Opan
Instituto de Pesquisas e Formação Indígena – Iepé
Instituto Sócio Ambiental – ISA
Associação Terra Indígena Xingu – ATIX
Instituto Indígena para Propriedade Intelectual - Inbrapi
HAY – Dário Vitória Kopenawa Yanomami
HAY – Davi Kopenawa Yanomami
Blog do Luar – Luar Sateré Mawé



segunda-feira, 4 de novembro de 2013

PARA O RESTO DE NOSSAS VIDAS




Existem coisas pequenas e grandes, coisas que levaremos para o resto de nossas vidas.

Talvez sejam poucas, quem sabe sejam muitas, depende de cada um, depende da vida que cada um de nós levou. Levaremos lembranças, coisas que sempre serão inesquecíveis para nós, coisas que nos marcarão, que mexerão com a nossa existência em algum instante.

Provavelmente iremos pela a vida a fora colecionando essas coisas, colocando em ordem de grandeza cada detalhe que nos foi importante.

Cada momento que interferiu nos nossos dias, que deixou marcas, cada instante que foi cravado no nosso peito como uma tatuagem.

Marcas, isso...! Serão marcas, umas mais profundas, outras superficiais, porém com algum significado também. Guardaremos dentro de nós e que se contarmos para terceiros talvez não tenha a menor importância, pois só nós saberemos o quanto foi incrível vivê-los.

Poderá ser uma música, quem sabe um livro, talvez uma poesia, uma carta, um e-mail, uma viagem, uma frase que alguém tenha nos dito num momento certo.

Poderá ser um raiar de sol, um buquê de flores que se recebeu um cartão de natal, uma palavra amiga num momento preciso.

Talvez venha a ser um sentimento que foi abandonado, uma decepção, a perda de alguém querido, um certo encontro casual, um desencontro proposital.

Quem sabe uma amizade incomparável, um sonho que foi alcançado após muita luta, um que deixou de existir por puro fracasso.

Pode ser simplesmente um instante, um olhar, um sorriso, um perfume, um beijo.

Para o resto de nossas vidas levaremos pessoas guardadas dentro de nós.

Umas porque dedicaram um carinho enorme, outras porque foram o objeto do nosso amor, ainda outras por terem nos magoado profundamente.

Quem sabe haverão algumas que deixarão marcas profundas por terem sido tão rápidas em nossas vidas e terem conseguido, ainda assim, plantar dentro de nós tanta coisa boa.

Lá na frente é que poderemos realmente saber a qualidade de vida que tivemos, a quantidade de marcas que conseguimos carregar conosco e a riqueza que cada uma delas guardou dentro de si.

Bem lá na frente é que poderemos avaliar do que exatamente foi feita a nossa vida, se de amor ou de rancor, se de alegrias ou tristezas, se de vitórias ou derrotas, se de ilusões ou realidades.

Devemos nos lembrar sempre de que hoje é só o começo de tudo, que se houver algo errado ainda está em tempo de ser mudado e que o resto de nossas vidas, de certa forma, ainda está em nossas mãos.



sexta-feira, 1 de novembro de 2013

AS INVASÕES BÁRBARAS




Pouco mais de cem anos atrás, no Peru, um professor de história da Universidade de Yale, Hiram Bingham, deixou o acampamento em um vale, a noroeste de Cusco, e caminhou através da floresta de nuvem para o cume de uma montanha, a mais de 7.500 metros acima do nível do mar. Lá, muito acima do rugir do rio Urubamba, ele encontrou uma antiga cidadela de pedra, bem como terraços esculpidos de templos e túmulos, edifícios de granito e paredes polidas que estavam cobertos de séculos de cipós e da vegetação.
Hiram Bingham tinha tropeçado em todo o sítio inca de Machu Picchu, no local que ele acreditava ser a "cidade perdida dos Incas". Machu Picchu pode vir a ser o maior e mais importante ruína descoberta na América do Sul, desde os tempos da conquista espanhola", escreveu na edição de 1913 da National Geographic.
Mas suas palavras foram equivocadas. Bingham não tinha "descoberto" Machu Picchu. Nem foi "perdido". Ele pode ter alertado para o mundo científico ocidental - pois não havia relatos de que nas crônicas dos invasores espanhóis -, mas as tribos locais devem ter tido conhecimento da sua existência. No entanto, o historiador Christopher Heaney, da Universidade do Texas e autor de um livro sobre Hiram Bingham, afirma que ficou surpreso ao descobrir um familiar dos indígenas Inca, próximo a cidadela. "Quando ele subiu a montanha estava muito surpreso ao encontrar uma família indiana no topo da colina", disse ele. Assim, a afirmação feita por Bingham sobre a “descoberta” tornou-se inócua e sem sentido.
É pouco provável que a sua terminologia tivesse ramificações adversas para os povos indígenas locais, mas a linguagem de colonos há muito tempo tem uma parte trágica, quando provoca a destruição de povos tribais em todo o mundo, não só pelo genocídio como pelo etnocídio. Durante séculos, as terras tribais têm sido consideradas como "vazias", a fim de justificar sua invasão e seu roubo por razões comerciais, militares ou de conservação. 
Os preconceitos racistas e a rotulagem dos povos tribais como 'atrasados', 'incivilizados' ou 'selvagens' - têm disseminado comportamentos e atitudes comuns de desrespeito e medo, o que vem sido levantado como argumentos de justificativa para o tratamento terrível a que os povos indígenas têm sido submetidos.
Quando os colonizadores europeus desembarcaram nas costas da Austrália, eles reivindicaram a terra, porque fora considerada como "terra nullius" -, ou seja, terras que pertencem a ninguém. Ledo engano. Os aborígenes já viviam lá há, talvez, 50 mil anos e ainda se invoca o conceito de "terra nullius", que só foi devidamente derrubado em 1992, permitindo que as terras a serem roubadas legitimamente das pessoas que ocuparam pela primeira vez o continente. 
Sob a lei colonial britânica, os aborígenes não tinham direitos, pois eles eram considerados muito "primitivos" para serem proprietários. Por conta desse entendimento, em pouco mais de 100 anos após a primeira invasão, a população aborígine foi reduzida de cerca de um milhão para apenas 60 mil.
Da mesma forma, quando os ventos alísios trouxeram Cristóvão Colombo ao "Novo Mundo", em 1492, fizeram com que ele, de fato, chegasse às terras dos povos que já viviam nessas terras por milênios. Eram tribos que tinham suas próprias leis de sucesso, rituais, crenças, valores, formas de vida e as suas próprias religiões. 
"Os brancos gritam hoje: ‘Nós descobrimos a terra do Brasil!’ ", diz Davi Kopenawa, do povo Yanomami, “como se a terra fosse desabitada! Como se os seres humanos não tivessem vivido nela desde o início dos tempos! 
Um pensamento ecoou por Megaron Txukarramãe, do povo Kayapó, quando disse: "A terra que os brancos chamam Brasil pertencia aos índios. Invadiram e tomaram posse dela."
A realidade, claro, é que a América do Sul e do Norte não eram “terras novas”, a Austrália não estava “desocupada” antes da chegada dos europeus e Machu Picchu, portanto, não foi "descoberto", em 1911. 
A frase “descobrimento da América” é absolutamente impertinente, o que eles descobriram foi uma América que tinha sido descoberto há milhares de anos antes por seus próprios habitantes. Assim, o que ocorreu foi a invasão da América - uma invasão de uma cultura muito estranha.

Luar