segunda-feira, 10 de março de 2014

O ESPÍRITO GUARDIÃO DA FLORESTA




...naquela noite chovia muito! Mamãe papagaio estava em seu ninho, cuidando dos seus ovinhos, pois estava próxima a chegada dos seus filhotinhos e, por isso, ela estava muito ansiosa e contente.
De repente, a chuva cessa e os ovinhos começaram a se partir, surgindo lindos papagaiozinhos. Mamãe papagaio acariciava seus filhotinhos toda satisfeita, quando percebeu que um deles era... um pouco estranho, e... destoava dos demais. Ele era todo azul e tinha o bico branco, diferente dos seus irmãos e dos papagaios, que são em sua maioria de cor verde e com o bico de cor escura. Mas..., estava contente mesmo assim, e cuidava de todos com o mesmo carinho. E, assim, o tempo foi passando...!
Todos os passarinhos da floresta zombavam de mamãe papagaio, porque ela tinha um filhotinho esquisito. Ela, por sua vez, não se importava porque amava muito a todos os seus filhotinhos, sem distinção. Aquele papagaio diferente era conhecido por todos como pássaro estranho. Por isso, ninguém queria brincar com ele, nem seus próprios irmãos, porque ele era diferente de todos. E, por conta disso, ele se entristecia e se perguntava:
- Por que ninguém gosta de mim?!
Mamãe papagaio, vendo seu filho amado triste e chateado, aproximava-se e lhe fazia muito carinho. Ele, então, sentindo toda aquela maravilhosa sensação do carinho de mãe, logo se esquecia de todos os maus tratos sofridos e ficava todo contente.
Certo dia, quando estava perto do grande rio, percebeu que tinha algumas formiguinhas trabalhando, carregando folhinhas. Então, ele pensou:
- Eu acho que vou ajudá-las, vai ser divertido e vou fazer novas amizades!
Pegou, então, uma folhinha com seu biquinho branco e a colocou na entrada do formigueiro. Vendo aquele passarinho estranho perto da sua morada, um monte de formigas se aproximou. Uma mais afoita disse:
- Que pássaro esquisito, olha lá...! Acho que ele quer tampar o formigueiro para morrermos sufocadas. É isso! Ele quer acabar com a gente! Vamos companheiras, ao ataque!
E correram todas em sua direção. Todas gritavam em um só coro:
- Fora daqui pássaro malvado!
O papagaio azul voou rapidamente e pousou numa grande árvore. Sem entender o que se passou naquela hora, ficou pensativo:
- Por que elas ficaram tão furiosas comigo e queriam me machucar?! Eu não fiz nada, só desejava ajudar...!
       Assim, ficou parado ali um bom tempo, tentando chegar, em vão, a alguma conclusão.
Passaram-se alguns dias e ele, sempre sozinho, brincava na copa das árvores da floresta, quando percebeu que uma pequena lagarta andava distraída em um galho próximo.
- Puxa! Como ela é bonitinha, será que essa lagarta linda poderia ser minha amiguinha? - Pensou.
Foi quando percebeu que ela estava em perigo. O galho em que ela estava era seco e parecia que ia se partir logo, logo e a lagarta certamente cairia no chão. Rapidamente voou, ficou embaixo do galho, sustentando todo o peso com suas asas. E assim que a lagarta conseguiu atravessar, ouviu-se um barulho de galho se quebrando. Dona Lagarta levou o maior susto! E vendo o papagaio azul por perto, começou a gritar:
- Você tentou me jogar no chão! Fora daqui, vai embora...!
E o nosso amiguinho voou novamente para bem longe. Pousou em uma pedra perto do grande rio e continuava pensando:
- Por que todos me mandam embora?! Por que não gostam de mim?!
Olhou para o rio e percebeu que uma Joaninha estava quase se afogando. Ela tentava desesperadamente subir em um tronco que estava boiando, mas tudo em vão. Sem demora, o papagaio azul arremessou uma pedra, que estava ao seu lado, chegando esta a cair próximo da pequena Joaninha, criando uma ondulação na água, arremessando-a longe, até chegar à terra firme.
Muito feliz por haver salvado a pequena Joaninha, o papagaio azul voou em sua direção e lhe perguntou:
- Nossa! A senhora está bem, Dona Joaninha?!
Ainda meio atordoada do susto, Dona Joaninha, muito irritada lhe responde:
- Você tentou me matar, atirando aquela pedra em mim, seu papagaio esquisito! Os habitantes da floresta correm muito perigo com você à solta por aí! Vou correndo reclamar de você ao Conselho Maior da floresta e vou relatar tudo o que se passou, a fim de que sérias providências legais sejam tomadas...!
O Conselho Maior, que era representado pelos habitantes mais importantes, idôneos e de conduta ilibada, fora convocado e o papagaio azul intimado a comparecer em determinada data e lugar, que foram aprazados.
        E devido à grande repercussão jurídica do caso, todos os habitantes da floresta se fizeram presentes para assistir ao julgamento do papagaio azul.
O representante do Ministério Público das Formigas pediu a palavra e, utilizando uma eloquente retórica, acusou formalmente o papagaio azul de ter tentado entupir o formigueiro e só não o fez por motivos alheios à sua vontade. A lagarta depôs como testemunha de acusação e afirmou, veementemente, que o papagaio azul havia tentado jogá-la no chão. Dona Joaninha, também, foi convocada como representante daqueles que se sentiam prejudicados e incomodados, e apresentou uma lista de acusações contra o papagaio azul.
O papagaio azul apenas ouvia a tudo, muito sentido com toda a repercussão do caso e profundamente entristecido com tudo que estava acontecendo, pois jamais gostaria de se tornar um peso para os demais. Sentia, mais ainda, por estar sendo considerado o motivo de pesar de muitos, por isso, ouvia a tudo sem dizer nada.
Até que toda a assembleia começou a gritar:
- Fora daqui! - Diziam uns.
- Que ele seja expulso da floresta! - Gritavam outros.
Depois de considerar por alguns minutos, o Conselho Maior da floresta prolatou sua irrecorrível e soberana decisão, proferida de forma unânime - o papagaio azul foi considerado culpado pelos crimes a ele imputados. E sua punição foi a expulsão da floresta, sendo obrigado a viver sozinho na grande rocha, que fica fora da floresta.
O papagaio azul totalmente submisso foi, então, em direção a sua nova casa, na grande rocha, fora da floresta. Ele estava sozinho agora e não podia mais entrar na floresta para ver os seus. Por isso, considerou:
- Puxa! Como vou fazer para me alimentar? Pensou por algum tempo e concluiu:
- Ah! Sim! Tenho de arranjar um jeito de entrar na floresta e sair de forma que ninguém nunca me veja.
O tempo foi passando e ele sempre voltava à floresta, mas nunca deixava que ninguém percebesse sua presença. Quase sempre encontrava alguns animaizinhos em apuros e os ajudava. Todos os habitantes da floresta percebiam que algo estranho acontecia. Algumas vezes, apareciam frutos em lugares onde faltavam alimentos, filhotinhos que caíam das árvores e não se machucavam...!
Como muita coisa boa acontecia com certa frequência, criou-se, entre os moradores da floresta, a crença de que existia um Espírito Guardião que protegia a todos e que Ele somente estava a realizar seus prodígios, porque o papagaio azul não estava mais entre os moradores da floresta. Todos acreditavam na bondade do Espírito Guardião da floresta e muitos passaram a ajudar aqueles que tinham dificuldades em seu nome. Todos estavam muito felizes e a Paz reinou por longos anos.
Certo dia..., o papagaio azul, já bem velhinho, mas com o semblante confiante e sempre otimista, saiu da caverna árida em que morava na grande rocha, fora da floresta e longe dos seus. E pousou nas margens do grande rio. Ficou ali algum tempo, tendo todos os motivos do mundo para se entristecer e reclamar, mas..., cantava, alegremente, ao Grande Espírito da floresta! Agradecendo, profundamente, por mais um dia...! Quando ouviu uma voz suave lhe chamando:
- Papagaio azul...!
Ao ouvir aquela voz, o papagaio azul tomou o maior susto, porque ninguém da floresta poderia ver que ele estava ali. Tentou rapidamente se esconder quando ouviu novamente aquela mesma voz, agora, ainda mais suave, dizendo:
- Não tenha medo, papagaio azul...!
Naquele instante, uma grande luz o envolveu totalmente.
- Sou o Grande Espírito da floresta, Aquele que criou toda a floresta e que sabe todas as coisas. Você está cansado, papagaio azul. Chegou a hora do merecido descanso. É hora de voltar para casa e para os seus, desfrutar das alegrias que conquistou.
- Mas..., eles me expulsaram de lá, de sorte que não posso mais voltar!
O Grande Espírito, em tom solene, ordenou-lhe:
- Olhe para o rio, papagaio azul.
O papagaio azul olhou para a água e foi a primeira vez em toda a sua vida que viu o seu próprio reflexo. Muito espantado, exclamou:
- Nooossa! Eu sou da cor do céu!
- Certamente! Compreende agora?! Você é um pedacinho do céu que eu permiti que descesse até a terra para ensinar a todos a amar indistintamente sem esperar receber nada de volta, fazendo com a mão direita, de forma que a esquerda de nada ficasse sabendo.
Neste momento, o papagaio azul começou a chorar muito. E suplicou:
- Oh! Por favor! Reconheço que falhei em minha missão, pois ninguém se lembra de mim, senão como um malfeitor!
- Sim, é verdade. Do papagaio azul ninguém mais se recordará, entretanto, do Espírito Guardião da floresta, os séculos passarão e ele jamais será esquecido. Ele será sempre lembrado, não por sua forma e beleza, mas por suas atitudes de bondade.
- Mas ninguém sabe que fui eu! Exclamou surpreso o papagaio azul.
- Eu o sei, e isso é o bastante - Falou o Grande Espírito da floresta. Você fez o bem a muitos sem esperar nada em troca, agora venha para os meus braços.
E o papagaio azul, não cabendo em si de tanta alegria, voou em direção ao céu, desaparecendo no horizonte.
Lá embaixo, na floresta, todos se sentiam felizes e amparados porque acreditavam que existia um Bom Espírito que cuidava deles. O respeito e admiração ao Espírito Guardião da floresta, desde então, é passado de geração para geração.




sexta-feira, 7 de março de 2014

O QUANTO DEIXEI DE VER JACI...?!




Certa vez..., em uma noite estrelada de luar, um homem remava suavemente sua canoa pelos igarapés próximos de sua aldeia.
Na popa de sua canoa, ele carrega o que para ele é o seu maior tesouro - seu filhinho de apenas dois anos de idade.
Enquanto continua remando, ele observa que seu filho está com o olhar fixado no alto, longe, parecendo totalmente absorvido pelo maravilhoso céu estrelado de luar.
Uma luz de um suave azul do luar ilumina o rosto do curumim, proporcionando uma beleza sem igual para o pai, encantado pela pureza angelical de sua criança.
Então, com aquela voz tenra, pequena e trêmula da descoberta das primeiras palavras, o curumim aponta para cima e fala:
- J..a..c.i !!! - que significa Lua.
Sim, isso mesmo! - diz o pai todo animado e muito admirado. É Jaci! Como Jaci é linda, não é, meu filho?!
O curumim nada responde, e continua encantado, observando o brilho natural da luz do luar, pois as crianças da aldeia intuitivamente sabem que a beleza da natureza precisa ser apenas contemplada, e que qualquer palavra é pequena, pobre e insuficiente demais para descrevê-la.
A partir de então, o pai passa a olhar para cima também, respira fundo e consegue observar a maravilha que é uma noite de luar a cobrir todas as árvores, rios, lagos, furos e igarapés, em toda a floresta!
Então, pensa consigo mesmo:
“Nossa! O quanto deixei de ver Jaci...?!”
Lembrou-se, então, de que fazia muito tempo, desde a última vez que pôde parar em si e contemplar profundamente o fulgurante e encantador brilho lunar. E perguntou pra si:
- Será mesmo que me esqueci de admirar Jaci?! Contudo, sinto que ela certamente não se esqueceu de mim, pois há pouco conversava com meu filhinho...!
Os dias agitados, os muitos afazeres, as preocupações, tudo isso pode nos fazer perder o contato com a natureza e com as coisas simples da vida.
Começa o ano e, quando menos percebemos, já estamos pela metade e... nesse tempo todo - pois é muito tempo – esquecemo-nos de admirar o céu, as nuvens, um pôr do sol, ou simplesmente apreciar o canto dos pássaros...!
Falta-nos tempo para aproveitar as oportunidades! – é o que alegamos. E quem é capaz de criar tais oportunidades? Apenas nós mesmos, ninguém mais!
O contato com a natureza nos renova as forças e nos proporciona momentos de reflexão, de pensamentos mais leves, sem o peso angustiante da preocupação. Tudo isso faz bem ao espírito e ao corpo. Precisamos recarregar nossas energias, constantemente, e o Grande Espírito Criador nos oportuniza a cada momento diversas fontes naturalmente inesgotáveis de tais recursos.
Não podemos nos deixar ser simplesmente consumidos, pelas preocupações do dia a dia.
A vida é muito mais que acordar, trabalhar, alimentar-se, usufruir de pequenos prazeres, dormir...!
Devemos aproveitar a nossa passagem terrena para aprender com a observação dos acontecimentos naturais, a fim de retirarmos daí as mais sublimes lições de vida necessárias para a continuidade de nossa evolução espiritual, sob pena de termos uma vida afogada em mil afazeres - sem tempo para nada – mas interiormente, vazios, tristes e depressivos.
Assim, não devemos deixar de ver Jaci, nem deixar de observar a natureza, de notar as estrelas, de nos maravilharmos com elas e, principalmente, de escutar o que elas sempre têm a nos dizer.
Que possamos olhar para Jaci e nos deixarmos seduzir pela beleza natural e encantadora de uma noite de LUAR!!!