Sair de seu lugar origem, de seu país, de seu mundo e viver num
lugar onde não só a língua e o clima são diferentes, mas as pessoas pensam de
uma outra forma, e os valores são outros, é sempre um grande desafio. Não é
fácil. E é natural que a adaptação seja difícil por se estar longe dos seus.
Saber que é preciso percorrer um longo caminho para ter o olhar e o abraço de
quem amamos, acaba se tornando o elemento de maior motivação.
Mudam-se
os costumes, as rotinas, os destinos, as vontades. Muda-se de vida por
completo. De início a adaptação é bem difícil, depois vem naturalmente o
deslumbramento. Começa-se por explorar o novo, o diferente. Conhece-se gentes e
lugares interessantes. Experimenta-se comidas estranhas com sabor carregado de
condimentos, e outras tantas exóticas no sabor e na aparência. Descobre-se
coisas inimagináveis, como o apreço e valorização pela busca de uma melhor
qualidade de vida. Depois vem a rotina, acelerada e intensa, mas rotineira. Uma
rotina em que muita coisa falta, em que a aprendizagem é solitária e a
aceitação de que ser brasileiro no mundo é inevitavelmente sinônimo de
violência, corrupção e desonestidade.
Muito embora saiba que viver fora do
Brasil seja um desafio muito grande, também experimentei um choque
cultural muito grande ao viver em uma das maiores cidades do mundo, como São
Paulo, onde minha luta por adaptação foi um dos maiores desafios. Cheguei ao
limite de minha resistência e determinação, pois adoeci e minha saúde, por fim,
restou comprometida.
Aqui, o vento é constantemente frio, com raros
momentos de raios solares, não obstante estejamos no verão suíço. Nossa! O verão é muito festejado por aqui, por causa
do sol. É o brilho do sol que faz as pessoas saírem de casa e passearem nas
ruas. Pois, no inverno, as pessoas ficam a maior parte do tempo trancadas
dentro de casa. Pois não só não tem o brilho do sol, como há muita
nebulosidade, frio e escuridão. Talvez esse seja um dos principais motivos pelo
qual muitos chegam à depressão, e por conta disso chegam a atentar contra sua
própria vida.
Já
no quente e ensolarado Brasil, belo por natureza, o problema é a política
social administrada por pessoas corruptas e a violência urbana cada vez mais
crescente, o que é lamentável, pois poderíamos aproveitar a natureza para
sermos mais felizes, vivendo em união com todos. Não obstante, união no Brasil
não passa de marca de açúcar.
Confesso
que me sinto seduzido pela vida simples que se leva no meio da floresta, onde
tudo parece perfeito demais para ser entendido como um verdadeiro paraíso. Ah...! Nada
como caminhar pela floresta, ouvindo o canto dos pássaros, sentindo o cheiro de
folha molhada, do gostoso banho no igarapé, das brincadeiras sempre muito
animadas com as crianças, do cheiro e gosto das frutas que só existem na
floresta Amazônica. E, principalmente, de remar no rio e me distrair, pescando
os saborosíssimos peixes amazônicos.
Não
sei até onde a “força” vai me levar. Nunca pensei que sairia da minha Aldeia.
Agora, encontro-me do outro lado do globo. As pessoas que aqui me conhecem, ou
seja, quando descobrem de onde eu vim, ficam tomadas de admiração e surpresa.
Em São Paulo, eu já impactava um bocado, pois era continuamente confundido com
boliviano, peruano, chileno, filipino, havaiano e outros. Aqui as pessoas veem
nos meus traços fisionômicos o quanto me distanciei dos meus. O que me torna um
espécime raro e em extinção.
Encontrei
aqui brasileiros que têm vergonha de sua origem, outros que conseguiram a
naturalização suíça e disso muito se orgulham. Parece que ser brasileiro é um
grande defeito, tamanha é a má fama de “nossoutros brazucas”. Eu, por minha
vez, não posso negar minha origem amazônica, não posso negar o nome do povo a
que pertenço, pois, muito mais que brasileiro, nasci Sateré Mawé em uma noite
de luar, além do que são minhas origens que me mantêm sóbrio e me impulsionam
na minha caminhada, na minha peregrinação pelo mundo.
Creio
que tudo em nossas vidas tem um propósito, tem um porquê. Muitas vezes não
entendemos. Eu mesmo não entendo as coisas que acontecem comigo desde criança,
sejam as pessoas que conheço, sejam os lugares por onde ando, sejam as coisas
que aprendo. Confesso que ainda preciso entender o porquê disso tudo. Sei
apenas que tenho de continuar, tenho de prosseguir, mesmo com os pés sangrando,
devo seguir em frente, aprendendo com meus erros e acertos, pois somos capazes
de mudar a realidade de acordo com nossa força de vontade e nossos propósitos
mais elevados.
Acredito
que é o sentimento pela alegria de viver e de ajudar ao próximo que nos faz
crescer espiritualmente. E é nesse intento de nutrir os sentimentos mais
elevados que posso dizer que me sinto feliz, mesmo estando tão distante de
casa, porque somos capazes de construir a realidade de acordo com nossas
decisões e boa vontade em servir. Decidamos, então, pelo melhor, porque a
decisão é sempre certa quando começada no alto, quando vinda do alto, quando
aprovada por Deus.